A Politização da Religião no Mundo Ocidental

 




Mariana Araújo

Licenciatura em Ciência Política e Relações Internacionais, 3º Ano - NOVA FCSH

As opiniões expostas neste artigo vinculam exclusivamente os seus autores.


A politização da religião no mundo ocidental


Desde os primórdios da nossa história que as esferas da religião e da política coexistem, influenciando-se mutuamente sobre diversas questões referentes à sociedade. Não podemos falar de política sem falar de religião e vice-versa. Dos Estados Unidos ao Brasil ou de Portugal a França, todos países do mundo viram o seu panorama político ser concebido e construído sob a influência da religião que controla a sua zona do globo, pois é um dos fatores que mais contribui para o nascimento de um Estado e para o seu futuro.

Atualmente, é possível observar uma certa ligação entre os movimentos populistas de extrema-direita e a religião, apesar desta ser uma área de estudo um pouco negligenciada por muitos cientistas políticos. Estamos num tempo onde a religião é utilizada como arma política, um fenómeno que podemos apelidar de “politização da religião” (Zúquete, 2017). Um perfeito exemplo, fácil de observar, deste fenómeno contemporâneo são as eleições do Brasil.

            Neste momento no Brasil, o país mais influente da América Latina e uma das maiores economias mundiais, encontramo-nos no período da 2ª volta das eleições presidenciais. Esta 2ª volta das eleições apresenta um confronto entre dois candidatos bastante diferentes um do outro: Jair Messias Bolsonaro e Luiz Inácio Lula da Silva. Dentro destes dois candidatos, Bolsonaro é aquele que melhor exemplifica este fenómeno de politização da religião. Isto já tinha acontecido aquando da sua primeira campanha eleitoral em 2018, quando se opôs a Fernando Haddad, mas numa dimensão em nada comparável ao que se está a passar em 2022. Jair Bolsonaro conseguiu convencer os eleitores mais religiosos, especialmente aqueles que seguem a corrente evangélica do cristianismo (o que corresponde a cerca de 30% dos brasileiros), de que este era o “candidato do bem”, construindo uma espécie de narrativa de “nós, cidadãos do bem, religiosos e que colocam a família acima de tudo”, contra os “outros, os bandidos que querem destruir a moral e os costumes da sociedade brasileira”. O Brasil dividiu-se numa guerra entre “nós” e os “outros” (Marzouki, 2016), levando o país a uma bipolarização e divisões nunca antes vistas, que apresentam uma escalada de violência e um nível de alienação da população extremamente assustadores, das quais o radicalismo do movimento populista de extrema-direita de Jair Bolsonaro é responsável.

            Podemos também observar um comportamento semelhante nos Estados Unidos da América, nas eleições de 2016 e 2020, que opuseram Donald Trump a Hillary Clinton e Joe Biden, respetivamente. Neste caso, a narrativa da religião também foi usada por Donald Trump, criando uma divisão semelhante à que assistimos no Brasil nos Estados Unidos, tendo também como protagonistas o grupo dos cristãos evangélicos, com predominância do grupo de “White Evangelicals” (Wilcox, 1990). Podemos dizer que este foi o primeiro grande exemplo à escala global, no mundo considerado ocidental, da politização da religião, que liga os movimentos populistas de extrema-direita a esta forma de fazer política.


            Estes dois casos nos Estados Unidos e no Brasil são apenas dois dos muitos exemplos deste fenómeno, que pode ser observado como algo em crescimento no mundo ocidental. Em Portugal, por exemplo, o Partido Chega, de André Ventura, segue a mesma linha de raciocínio e de ação, sendo que neste caso é o catolicismo o alvo da sua retórica. Em França, temos o caso de Marine Le Pen e o Partido Reagrupamento Nacional. Até mesmo em Itália, com Giorgia Meloni e o Partido Irmãos de Itália, que no último mês, inclusive, ganharam as eleições e se encontram no poder no país, temos mais um exemplo do que está a acontecer.


            No mundo ocidental, não faltam casos que exemplifiquem a politização da religião, que demonstrem a guerra do “nós” contra “os outros”. Vivemos num período onde as esferas da religião e da política se unem cada vez mais numa particular “imaginação moralista da política” (Müller, 2015), num clima de bipolarização da sociedade e que em nada contribui para o avanço desta. Pelo contrário, encontramo-nos cada vez mais divididos.

Posto tudo isto, não deveremos advogar para uma separação permanente entre a política e a religião?


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