Líderes e personalidades: uma introdução à psicologia política



Bruno Filipe

Licenciatura em Ciência Política e Relações Internacionais, 3º Ano - NOVA FCSH

As opiniões expostas neste artigo vinculam exclusivamente os seus autores.


A psicologia política, como campo de investigação entre a ciência política e a psicologia, tem mantido uma tradição académica bastante rica e complementária dos estudos políticos. Especificamente, desde os horrores da II Guerra Mundial que a personalidade e a política têm sido objeto de estudo de imensos académicos. Atualmente, esta preocupação parece voltar a surgir em trabalhos académicos, num contexto de emergência de forças de nova direita radical e partidos populistas, que decidem focar a sua estratégia na disposição e cobertura mediática dos seus líderes (Ignazi 2014; Petersen e Laustsen 2020). Serve este presente artigo apresentar alguns conceitos centrais à psicologia política e algumas noções referentes ao estudo interligado da personalidade com a política.

Como as duas ciências sociais em questão, a psicologia política procura explicar comportamento (político), recorrendo ao estudo das razões e motivações dos seus principais atores, seja na aprovação de legislação, no exercício de voto ou na entrada numa guerra internacional. No fundo, procuram-se explorar as problemáticas da ciência política através de conceitos e metodologias da psicologia social. A aplicabilidade transversal a temas da ciência política provém do recurso a determinados conceitos base da psicologia social. Sucintamente, o ator político tem sido estudado com base na sua personalidade, vista como atributos estáveis e consistentes do indivíduo, nos seus valores, i.e., o código moral do indivíduo, e na sua identidade, definida como autoperceções. Mais recentemente, têm sido incorporadas na sua análise atitudes, emoções e processos cognitivos, como formas de reação ao ambiente exterior ao psicológico do ator (Cottam et al. 2015).

Por isso, esta literatura tem sido constantemente criticada por se considerar que é o ambiente que rege o comportamento político, e não o psicológico individual. Apesar de não se poder negar a influência sufocante do exterior social, não se deve esquecer que da mesma forma que os atores sociais são moldados pelo seu ambiente, também o conseguem moldar. Neste sentido, o estudo da psicologia política complementa o estudo dos fenómenos políticos, no geral (Jost e Sidanius 2004). Especificamente, este argumento tem sido conduzido contra o estudo da personalidade e o seu impacto na condução da política. Apesar disto, esta é a tradição mais antiga da psicologia política, tendo começado nos anos 20 do século passado, com os contributos da psicanálise de Freud. Com o desenvolver da literatura, percebeu-se que quando os indivíduos têm poder e recursos pessoais devido à sua posição num sistema político, e o ambiente externo os permite exercer influência sobre um processo político, o impacto da sua individualidade (personalidade) é evidente (Petersen e Laustsen 2020).

Uma das abordagens mais interessantes ao estudo da personalidade política teve origem no fim da II Guerra Mundial, com o estudo de figuras dos regimes fascistas da Europa Ocidental. Inicialmente, esta corrente de investigação ficou associada ao uso de questionários e entrevistas, que pretendiam perceber os processos de socialização primários dos atores políticos e a sua correção com o seu comportamento adulto. A título de exemplo, procurava-se a presença de parentes autoritários durante a infância do indivíduo, o forte controlo de impulsos íntimos e forte convencionalismo, entre outros estereótipos (Petersen e Laustsen 2020). Atualmente, o estudo da Personalidade Autoritária pode ser estendido além da política e tem como principal foco a figura do líder forte e dominante.

Tendo como conceito central a dominância, como traço de personalidade, entende-se a indução de medo através de intimidação ou coerção, sendo esta característica psicológica uma das mais facilmente associáveis através da perceção individual. Retirando exemplos dos EUA e da Europa Ocidental, demonstrou-se que indivíduos que se identificam como conservadores ou de direita são mais prováveis a ter preferência por personalidades dominantes tanto na política, como fora dela. Importa, no entanto, também considerar o contexto que leva os indivíduos a escolher um líder com personalidade dominante. Complementariamente, a literatura referente a followership explica que os indivíduos se tendem a alinhar a um líder que seja o mais competente a resolver problemas a nível grupal. Neste sentido, existem um conjunto de estudos que demonstram que em contextos de maior conflito social, as pessoas são mais propensas a preferir líderes dominantes. Por outro lado, em contextos sociais mais neutros, há mais preferência por líderes não-dominantes (Petersen e Laustsen 2020).

Com isto, resta perceber o que leva os indivíduos a escolher estes líderes nestes contextos específicos. O que se verifica é que o apoio a líderes dominantes em contextos sociais conflituosos os torna mais propensos a promover exploração, sendo esta a principal razão para o seu afastamento da liderança em tempos de paz. Apesar de ainda não existirem bases empíricas que o comprovem, a escolha de um líder dominante reflete-se na aceitação de ser explorado de modo a vencer um dado conflito social (Petersen e Laustsen 2020).

Sob forma de nota conclusiva, a personalidade parece ser um aspeto a considerar, não apenas no estudo da política, mas no próprio exercício de cidadania. A psicologia política tem apresentado quadros teóricos e bases empíricas interessantes que podem ajudar o estudo de fenómenos políticos variados, especialmente acrescentando uma nova camada de conhecimento a comportamentos por vezes considerados desviantes pela literatura da ciência política.

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